"Só existe um problema filosófico realmente sério: é o suicídio." Esta é a frase com que Albert Camus abre o livro "O Mito de Sísifo", e ela sempre ficou ecoando na minha cabeça. O título se refere ao titã da mitologia grega que, após a luta com os deuses, foi condenado pelo Olimpo a eternamente empurrar montanha acima uma grande pedra, apenas para, chegando ao cume, vê-la rolar de volta à base, tendo que iniciar novamente seu trabalho. Para Camus, se entendi bem suas idéias, a vida é essencialmente absurda, como o trabalho do titã em questão: qual o propósito de continuar empurrando tal pedra, se sabemos que o trabalho não terá nenhum resultado?
Apesar do existencialismo poder ser considerado uma filosofia pessimista, a resposta de Camus ao problema sempre me pareceu um tanto quanto arbitrariamente otimista. Ele diz que, ao chegarmos ao pico da montanha, naquela fração de segundo entre o término do trabalho de empurrar a pedra e a ação gravitacional que a fará rolar novamente, anulando o esforço que acabamos de empreender, temos um momento de pura lucidez em que o trabalho parece valer a pena. E é esse periódico momento de lucidez que, para ele, torna o suicídio uma resposta inaceitável ao absurdo da vida. Ouso discordar.
Sísifo não empurrava a pedra porque via sentido em seu trabalho. Ele o fazia porque era obrigado por uma força mais poderosa que ele, nesse caso, os deuses do Olimpo. E isso me leva a Freud.
Quando Sigmund Freud desenvolveu sua teoria psicanalítica, foi dito que ele feriu a humanidade com a terceira ferida narcísica. As duas primeiras foram a descoberta de que a Terra não é o centro do universo através de Copérnico, e a segunda a de que os seres humanos são produtos de mero acaso evolutivo, e não criações especiais de um deus todo-poderoso. Freud então desferiu o golpe final quando demonstrou que, a despeito de toda a nossa racionalidade, grande parte do que somos e de como agimos não está sob o nosso controle, sendo produto de uma outra parte de nós que ele chamou de inconsciente.
E é isso que, na minha opinião, nos mantém vivos. Mesmo sabendo que, racionalmente, não há sentido algum em continuar empurrando uma pedra que vai rolar de volta à base da montanha, há uma espécie de força, fora do controle da razão, que nos força a continuar a fazê-lo. Alguns a chamam de deus, outros de destino; eu a chamo, com Freud, de inconsciente.
"We are a psychic process which we do not control, or only partly direct." - Carl Gustav Jung
Um comentário:
Me identifiquei com o seu último pensamento. As vezes,ao observar crentes religiosos falando sobre a influência da presença de Deus em nossas vidas,de como isso parece tornar-nos pessoas melhores, mais "felizes", mais aguerridas, mais fortalecidas.. As vezes, me pego pensando que talvez, essa entidade que muitos consideram Deus, não seja nada mais do que nós mesmos, ou melhor, de acordo com Freud e seu texto, nosso inconsciente. Apenas ocorre que o homem,em sua necessidade de rotular e padronizar tudo, encontrou uma palavra diferente para isso.
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